Estado promove encontro sobre enfrentamento do racismo no sistema prisional

  • 5 de setembro de 2023
  • Sol FM

Evento reuniu servidores penitenciários e representantes de diversas instituições para debater sobre o assunto

A Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS) e a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) promoveram, nesta segunda-feira (4/9), o 1º Encontro Nacional sobre a Política de Enfrentamento ao Racismo no Sistema Prisional do Rio Grande do Sul e a 1ª Mostra Nacional de Experiências Compartilhadas. O evento, voltado a servidores penitenciários, foi realizado na Cinemateca Capitólio, em Porto Alegre.

Durante a solenidade de abertura, o titular da SSPS, Luiz Henrique Viana, ressaltou a importância de trazer para o debate o combate ao racismo não só no âmbito prisional, mas na sociedade como um todo. “A temática que abordamos tem como foco o sistema prisional, porém deve estar sempre no nosso dia a dia”, disse. “Esse trabalho tem sido realizado a diversas mãos, e reconhecemos que muito tem sido feito na nossa área, com abordagens e capacitações. E o que se testemunha aqui é mais um passo. É dever do Estado criar espaços para que discussões sobre igualdade e combate a qualquer forma de discriminação social.”

De acordo com o Infopen-RS, sistema informatizado de registro das informações das pessoas privadas de liberdade e de ocorrências nos estabelecimentos prisionais do Estado, em julho de 2023, o sistema prisional gaúcho custodiava 42.288 pessoas, das quais 39.820 eram homens e 2.468, mulheres. Desse total, 33,1% dos homens e 31,6% das mulheres eram negros (pretos e pardos). Em relação à população geral do Rio Grande do Sul, a porcentagem neste quesito reduz consideravelmente. Conforme dados divulgados pelo IBGE em 2017, as pessoas negras correspondem a 18,2% da população – ou seja, a população negra é maior dentro do sistema prisional do que na sociedade gaúcha em geral.

“O que ocorre no sistema prisional impacta na segurança pública. Isso torna essencial encontros com temas como este. A redução da violência não passa só pelas forças de segurança, mas também pelas ações transversais, de redução da desigualdade, de promoção da educação e de mudança cultural de toda a sociedade”, avaliou o secretário da Segurança Pública, Sandro Caron. O chefe da Polícia Civil, Fernando Sodré, também compareceu à cerimônia de abertura.

A iniciativa de realizar o evento foi da Comissão de Elaboração, Monitoramento e Implementação da Política Penal de Enfrentamento ao Racismo no Âmbito do Sistema Prisional, implementada no início de 2022 para estimular a igualdade e o combate a qualquer forma de discriminação racial. São ações afirmativas executadas a curto, médio e longo prazo, levando em conta as áreas de atuação prioritárias e as demandas mais imediatas.

“Esse dia é mais um marco para o sistema prisional gaúcho e também para a nossa sociedade. Discutir um tema tão necessário é vital para chegarmos ao horizonte da sociedade que queremos. Em pleno 2023, não há mais espaço para o racismo e, por isso, não devemos tolerar nem aceitar qualquer tipo de preconceito, seja ele qual for. O preconceito se combate provocando debates que fomentam reflexões sobre o nosso cotidiano, e é por isso que celebro esse evento. Celebramos um momento como esse, que nos fortalece e que nos possibilita construir um sistema prisional mais humano e digno”, afirmou o superintendente dos Serviços Penitenciários, Mateus Schwartz.

Gilvandro Antunes, integrante do movimento Vidas Negras Importam RS, salientou o quanto este tema é importante de ser debatido em diferentes esferas da sociedade: “Nós falamos em racismo estrutural porque ele é disseminado e está incrustado nas mais diversas estruturas sociais. E parte dessa estrutura é o Estado – não existe racismo sem a participação do Estado. Ele é não só um produtor, mas um gestor do racismo. Políticas como essa não resolverão este problema, porém são importantes, elas avançam, mostram disposição, diálogo”.

Na solenidade de abertura do evento, houve uma intervenção cultural do grupo Poetas Vivos, iniciativa de jovens pretos e periféricos que apresentam slam, poesia e música com temáticas que envolvem antirracismo e questões sociais.

O evento reuniu especialistas e representantes da comunidade negra, além de diferentes instituições, para compartilharem experiências, conhecimentos e saberes, a fim de ampliar o diálogo sobre a temática. Também houve o fomento ao black money, com a comercialização de produtos de lojas de proprietários negros, como a Pimenta Rosa e a Turbante Vermelho, e a participação da trancista Deise Freitas.

Além disso, todo o coffee break foi produzido com mão de obra de pessoas privadas de liberdade do Complexo Prisional de Canoas. As bonecas de pano abayomi, entregues no início do evento para o público, foram fabricadas por apenadas do Presídio Feminino de Torres.

Nota técnica de enfrentamento do racismo no sistema prisional

O primeiro painel da manhã teve como objetivo apresentar a Nota Técnica de Enfrentamento ao Racismo no Âmbito do Sistema Prisional do Rio Grande do Sul. O documento, produzido em 2022, faz parte de uma série de esforços do governo para desenvolver uma política estadual com o intuito de transformar as práticas no sistema prisional gaúcho, atendendo aos servidores penitenciários, às pessoas privadas de liberdade e às egressas do sistema prisional, contemplando dispositivos legais nacionais e internacionais.

A nota apresenta ações voltadas a capacitar os servidores quanto à temática, dentre elas, a inclusão da disciplina Gênero e Etnia no currículo do curso de formação da Escola do Serviço Penitenciário (ESP) para novos policiais penais, que já está em vigor.

Além disso, foram apresentados os planos de cotas no âmbito educacional para pessoas negras privadas de liberdade, já que, atualmente, esse público representa 34% da população prisional que estuda. No âmbito profissional, a proposta é se criar cotas para os 3.867 apenados negros que realizam alguma atividade laboral. Mediada pela técnica superior penitenciária Carolina Reis, a apresentação foi realizada pelos palestrantes Márcia Gabriela Lemos, Camila Rosa, Wellington Mancilha e Lilian Ramos, membros da Comissão de Elaboração, Monitoramento e Implementação da Política Penal de Enfrentamento ao Racismo.

Antirracismo como política institucional

Ainda pela manhã, ocorreu o painel Antirracismo como política institucional, mediado pela servidora Camila Rosa. O sociólogo e tenente-coronel da Brigada Militar Dagoberto Costa palestrou no evento, fazendo indagações a respeito da origem do racismo e da responsabilização sobre a questão no âmbito institucional, já que, segundo ele, as instituições devem promover a equidade no serviço público. Ele destacou a importância de se ter espaços como esse para a discussão do tema e a conscientização de servidores sobre a necessidade de se enfrentar o racismo dentro do sistema prisional.

O procurador do Estado Jorge Terra debateu sobre a desigualdade na área da educação, que compromete a formação da pessoa e, por consequência, atinge também a capacidade profissional do indivíduo. Ele também tratou do racismo no âmbito das decisões judiciais e da importância da concepção e da implementação de políticas públicas voltadas a combater as discriminações raciais.

O racismo e as possibilidades de enfrentamento

No turno da tarde, foi realizado o painel Racismo e as possibilidades de enfrentamento, facilitado por Tamires Viegas. Na ocasião, o professor e advogado Lúcio Almeida debateu o racismo estrutural inserido dentro da sociedade como um problema histórico e elogiou a iniciativa da SSPS e da Susepe como espaço próprio para iniciar este diálogo.

A professora e advogada Letícia Marques Padilha, presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB/RS, inseriu na conversa os contextos social e histórico dos povos negros no Brasil e falou sobre como é necessário recuperar esta história. Ela discorreu sobre a importância de oportunizar espaços de representatividade e políticas públicas para que se avance na discussão sobre o racismo estrutural.

Vivências e visão nacional e internacional da política penal antirracista

O segundo painel da tarde abordou as Vivências e a visão nacional e internacional da política penal antirracista, facilitado por Lucas Trajano. O poeta e escritor Rodrigo Sabiah, que é egresso do sistema prisional, contou sua trajetória, defendendo um trabalho de prevenção a partir de políticas públicas que contribuam para a vida dos jovens em situação de vulnerabilidade. “Eu defendo um recomeço e o diálogo para que se quebre o ciclo de ir para a cadeia, sair e voltar para a cadeia”, explicou.

O coordenador de Educação Prisional da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), Rodrigo Dias, também compartilhou sua história e suas experiências. “Nós, enquanto servidores, precisamos refletir sobre a perpetuação do racismo dentro do nosso trabalho e até onde a nossa presença contribui para que episódios racistas continuem ocorrendo”, salientou.

O grupo Afro-Sul Odomode encerrou a programação das mesas redondas com uma apresentação cultural.

Finalizando o evento, ocorreu a 1ª Mostra Nacional de Experiências Compartilhadas, criada para divulgar as boas práticas que visam qualificar as políticas estaduais sobre a temática no sistema prisional. Os estados do Rio de Janeiro, Maranhão e Ceará apresentaram projetos nas áreas da inclusão, igualdade racial e enfrentamento da discriminação racial no sistema prisional. Os troféus foram produzidos com a mão de obra prisional dos apenados da Penitenciária Modulada Estadual de Montenegro.


GOV RS | Texto: Ascom SSPS | Edição: Secom | Fotos: João Pedro Rodrigues/Ascom SSPS

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