Interior do RS tem contágio mais rápido por Covid-19 do que a Região Metropolitana

Na semana passada, o Rio Grande do Sul ultrapassou a marca dos mil casos de Covid-19. Apesar da constante no crescimento de novos pacientes diagnosticados, levantamento realizado pelo Correio do Povo a partir de dados da Secretaria Estadual de Saúde (SES) indica que a velocidade do contágio entrou em ritmo distinto entre as cidades da Região Metropolitana e das localizadas no interior.

Até às 22h de domingo, 26 de anril, o Estado tinha 1.208 pessoas infectadas pelo vírus em 125 municípios. Destas localidades, 99 eram do interior, o que representa 79,2% do total de cidades gaúchas com casos confirmados da Covid-19. Esse patamar vem crescendo rapidamente. Seis dias antes, 74,48% do total de cidades com pelo menos um paciente diagnosticado era de fora da Região Metropolitana de Porto Alegre. No dia 14 deste mês, era de 73,4% e no dia 8, 69,87%.

Os números apontam para um avanço mais acelerado da doença rumo aos rincões mais distantes da Capital. O comércio aberto, com atividades essenciais e não essenciais funcionando em algumas cidades, pode estar contribuindo com este processo. O assunto também tem sido tema de conversa entre prefeitos gaúchos que, apreensivos com a Covid-19, têm observado casos pipocando até mesmo em cidades pequenas, segundo o vice-presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e prefeito de Taquari, Maneco Hassen.

Até o levantamento de ontem da SES, o interior gaúcho concentrava 48,59% dos casos. Apesar do número de cidades ser maior e o de casos registrados nestas cidades não superar a metade do total de pacientes registrados no Rio Grande do Sul, seis dias antes este índice era bastante inferior.

Em 8 de abril, os municípios de fora da Região Metropolitana concentravam apenas 36,66% do total de casos no Estado, o que demonstra um crescimento não só no número de cidades como também no total de casos.

A presença do vírus em um número maior de pontos, segundo Tiaraju Duarte, da UFPel, é indicativo de que ele está se espalhando facilmente. Somente ontem, Trindade do Sul, Três Palmeiras, Santa Bárbara do Sul, Marcelino Ramos, Cruz Alta, Coronel Bicaco e Ciríaco, municípios situados em regiões distintas, registraram seus casos de número 1.

“Na epidemiologia, se tem um caso confirmado no interior, pode ter mais de um, porque tem a subnotificação”, observa o professor adjunto do departamento de Geografia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Tiaraju Salini Duarte, que coordena grupo de pesquisas focado na dispersão do Covid-19 no Estado. Conforme o especialista, as cidades-polos, por terem uma estrutura de serviços e comércio e até mesmo de saúde mais robustas, acabam gerando tráfego de pessoas de localidades menores.

“O Covid-19 funciona como uma mercadoria que, por sua vez, são acompanhadas por pessoas”, ilustra como tem funcionado a dispersão da doença pelo Rio Grande do Sul. O especialista acredita que situações como a de Passo Fundo, que tinha até ontem a noite 102 casos e nove óbitos confirmados, poderão gerar reflexos no seu entorno. Duarte lembra que isso vem ocorrendo no norte gaúcho e dentro de alguns dias mais cidades do entorno deverão registrar seus primeiros casos.

Marau, distante cerca de 30 quilômetros de Passo Fundo, já tem 49 doentes e foi uma das primeiras localidades onde a doença evoluiu de forma desordenada a partir de uma única contaminação. No dia 9, o governo do Estado tinha flexibilizado o funcionamento de restaurantes, lancherias, salões de beleza e lojas de chocolate no Rio Grande do Sul.

No dia 15, foi a vez de permitir que municípios do interior gaúcho, com exceção das regiões metropolitanas de Porto Alegre e Caxias do Sul, autorizassem as atividades do comércio, desde que observadas as regras de acesso e de higiene. No dia seguinte, o governador manteve as restrições apenas à Grande Porto Alegre. No entanto, Leite não concorda que suas medidas possam ter causado este impacto. “Não há relação dos casos agora com a flexibilização que se tenha feito. Tem uma demora de tempo. Não registramos uma redução substancial no distanciamento social. Então ainda não é possível associar uma coisa à outra”, garante.

Argumento que, segundo Duarte, não está errado. “Vejo problemas em relacionar a situação, por causa da questão das políticas públicas. A partir do momento que os municípios são permitidos a adotar suas medidas necessárias às suas medidas locais, há diferenças entre eles”, acrescenta. De acordo com o especialista, somente com o avançar de mais algumas semanas é que será possível afirmar se é reflexo da flexibilização. “Há 10 ou 12 dias de delay na interiorização dos casos, numa escala temporal”, pontua.

Mesmo assim, Duarte lembra que o comércio aberto, ainda que siga adequações sanitárias, justifica um aumento na circulação de pessoas. “A grande questão que nós temos é que os fluxos comerciais e urbanos entre as pequenas cidades e as capitais regionais, é que elas são portas para pressionar o sistema de saúde”, alerta.


 

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