Amplamente acompanhada e divulgada a primeira fase da reforma tributária, sobre o consumo, foi promulgada em 20 de dezembro de 2023. Não foi como queríamos, com debates mais técnicos e menos ideológicos, mas a Proposta de Ementa à Constituição (PEC) 45/219 foi aprovada e se transformou na Emenda Constitucional 132 trazendo uma série de alterações no sistema tributário nacional.
Agora toda atenção está direcionada para as leis complementares, que trarão regramentos importantes, como a definição da alíquota padrão, dos regimes diferenciados, dos itens da cesta básica e dos bens e serviços que terão incidência do imposto seletivo.
O grande desafio da reforma é simplificar e tornar o sistema tributário mais justo, reduzindo as desigualdades. Para isso, foi criado o Imposto de Valor Agregado (IVA) dual, unificando cinco tributos (Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS) em dois: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), em nível federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em nível estadual e municipal. Essa nova sistemática adotará o modelo não cumulativo, ou seja, os tributos são calculados com uma alíquota maior com utilização de créditos, assim como é a sistemática do ICMS atualmente.
Já as empresas optantes pelo Simples Nacional, que representam a grande maioria das empresas constituídas no Brasil, terão que ter muito critério e aprofundamento em sua operação. Deverão fazer uma importante opção: permanecer como estão atualmente, gerando crédito proporcional aos tributos que compõem o IBS/CBS (menor), ou aderir ao novo modelo para gerar crédito integral em suas vendas. No entanto, a adesão ao novo modelo obrigará a apurar os impostos por dois sistemas, o que é frontalmente contrário à sonhada simplificação.
A transição se dará no longo período de 2026 a 2032, durante o qual as empresas serão obrigadas a apurar seus tributos em dois modelos simultaneamente: o atual com Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS; e no novo modelo do IBS/CBS.
Outro aspecto que preocupa e exigirá muita atenção é a inevitável oneração do setor de serviços. Pela nova sistemática, utilizará a alíquota padrão, a mesma da indústria e do comércio. No entanto, diferentemente da indústria, o setor de serviços não possui uma longa cadeia produtiva que possa proporcionar créditos. Pelo contrário, seu maior “insumo” é a folha de pagamento, que não gera crédito.
Diante desse novo cenário, os profissionais da contabilidade e as assessorias contábeis terão papel central na implantação e acompanhamento do novo modelo de tributação. A longa transição, que poderá até dobrar as horas de trabalho para cumprimento das obrigações fiscais e legais, deverá ser remunerada, pois não é justo que se aumente a exigência sem o correspondente ajuste nos honorários. Até porque, se houver um contrato de prestação de serviços bem elaborado, a previsão de cobrança por novas obrigações certamente será constatada. Além disso, todas as empresas precisarão estudar a melhor e mais barata forma de se adaptar ao IBS/CBS, visto que as empresas do Simples Nacional terão que fazer uma opção e as demais, sem exceção, vão precisar mapear seus fornecedores em função dos créditos, já que as empresas do Simples Nacional que não aderirem ao novo modelo proporcionarão um crédito reduzido, que aumentaria expressivamente o imposto a pagar.
Importante ressaltar que cada empresa deverá ser analisada individualmente, num verdadeiro serviço de “alfaiate”, pois cada uma possui características próprias. Também porque os fornecedores terão que ser analisados individualmente para sabermos como gerarão o crédito, se integral ou proporcional. Reforço que essa decisão, se não tomada da forma mais acertada, poderá colocar sob risco até a continuidade do negócio.
Em suma, os empresários e suas assessorias contábeis terão muito trabalho. Estamos diante de decisões estratégicas que impactarão fortemente no futuro das empresas. A hora é de muito estudo, capacitação e, principalmente, entender que o momento é fundamental para as melhores decisões, com todas as suas consequências. Além disso, o trabalho será dobrado no longo período da transição, com a apuração dos tributos nos dois regimes. Sabemos da dificuldade para adaptar as mudanças e de conseguir transformar o nosso esforço em valorização, mas a reforma foi aprovada e, nas dificuldades, surgem as oportunidades. Como diz aquela velha máxima, enquanto uns choram, outros vendem lenço.
Diogo Chamun, diretor de políticas estratégicas e legislativas da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (FENACON).
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