Tecnologia Neural em Ascensão na China: Oportunidades e Riscos no mercado internacional

  • 3 de novembro de 2025
  • Sol FM

A China acabou de lançar um plano nacional ambicioso com o objetivo de liderar globalmente o setor de Interfaces Cérebro-Computador e Inteligência Computacional e Cognitiva (ICCs), tecnologias capazes de conectar diretamente o cérebro humano a dispositivos digitais. O documento oficial, elaborado por sete ministérios chineses e publicado pelo Conselho de Estado, estabelece metas de avanços técnicos até 2027 e busca consolidar a liderança industrial da China até 2032.

A estratégia chinesa se diferencia pela forte coordenação entre governo central, órgãos reguladores, universidades e empresas privadas. Essa articulação acelera a transição da pesquisa básica para aplicações clínicas e comerciais, o que tem gerado atenção internacional, especialmente entre países com laços econômicos relevantes com a China — como o Brasil. Em um cenário onde o ritmo de inovação supera a capacidade de adaptação regulatória em muitos mercados, empresas estrangeiras interessadas em importar ou distribuir essas tecnologias devem considerar desde cedo os aspectos legais e regulatórios envolvidos.

O plano está estruturado em cinco grandes eixos estratégicos, que funcionam como laboratórios integrados: desenvolvimento de componentes essenciais; integração entre hardware e software; aplicações médicas; dispositivos não invasivos para uso cotidiano; e construção de um ecossistema industrial e regulatório. Esses centros atuam como plataformas de transformação científica, com metas claras de aplicação industrial e comercial.

Os resultados práticos já são visíveis. Empresas como a NeuroXess e a NeuCyber NeuroTech demonstraram avanços clínicos significativos. Em Shanghai, pacientes com paralisia conseguiram controlar aplicativos e jogar xadrez utilizando apenas sinais cerebrais. O chip Beinao-1, do Instituto Chinês de Pesquisa Cerebral, apresentou estabilidade e segurança em testes clínicos, sinalizando que a tecnologia está pronta para expansão global.

A China também aposta no mercado de consumo com dispositivos ICCs não invasivos, como fones de ouvido, capacetes e óculos com sensores neurais. Aplicações incluem monitoramento de fadiga em motoristas, prevenção de acidentes industriais e controle de videogames pelo pensamento. A capacidade chinesa de escalar a produção desses dispositivos, somada à sua liderança em manufatura eletrônica, reforça a expectativa de que esses produtos entrem em mercados internacionais em breve.

O Brasil é, de fato, um mercado promissor para tecnologias emergentes. No entanto, a entrada dessas soluções no país exige atenção jurídica estratégica, de modo a garantir conformidade regulatória, segurança jurídica e liberdade de operação (freedom to operate), para que não ocorra a violação de direitos de propriedade intelectual. Além disso, tecnologias que processam sinais neurais lidam com dados pessoais sensíveis, como informações biométricas e neurofisiológicas, classificados como tais pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Isso demanda um alto nível de governança em privacidade, com medidas que assegurem transparência, consentimento e segurança da informação desde a concepção dos produtos.

Certamente, com isso, o arcabouço legislativo e regulatório brasileiro, poderá ganhar novos aportes e discussões, como por exemplo a reforma do Código Civil, que já se encontra em debate no Congresso Nacional. O texto da proposta traz os neuro direitos como parte indissociável da personalidade e lhe atribuem a mesma proteção legal, não podendo ser transmitidos, renunciados ou limitados. Isto, em última análise, testará a capacidade dos institutos jurídicos brasileiros, principalmente aqueles relacionados aos direitos da personalidade.

Ademais, intermediariamente, no Brasil, as soluções revolucionárias por ICCs podem suscitar outras questões referentes a saúde pública, como requerimentos de incorporação à rede pública de saúde (SUS) por atuação e recomendação da CONITEC, ações para fornecimento das novas soluções a pacientes que não possam custear o acesso à tecnologia, registros em entidades reguladoras, entre outras pretensões que precisarão ser analisadas e decididas no âmbito do sistema nacional. Esse cenário tipicamente brasileiro demanda um olhar atento dos agentes inovadores para o sistema e institutos do país.

Além disso, é possível imaginar que, com o avanço dessas tecnologias por diferentes empresas, de diferentes países, possam surgir questões de padronização e interconectividade. Isto, aliado às proteções por patentes dos players inovadores, pode lançar desafios competitivos ao mercado e aos sistemas jurídicos, como temos acompanhado nas disputas de patentes essenciais (SEPs), nova fronteira dos confrontos geopolíticos e tecnológicos entre potências mundiais.

Em síntese, a China avança de forma estratégica em um campo de altíssimo impacto social e econômico. A ascensão das tecnologias neurais — ainda em fase de discussão e observação em muitos países — exige dos players internacionais uma postura cautelosa, informada e juridicamente bem orientada. Para empresas estrangeiras, inclusive chinesas, que buscam operar no Brasil com soluções baseadas em ICCs, a presença de um parceiro jurídico especializado em propriedade intelectual, proteção de dados e regulação tecnológica será não apenas útil, mas essencial.

*Danielle Campello e Paulo Armando Innocente de Souza são advogados do Di Blasi, Parente & Associados


Vera Moreira Comunicação | Fotos: Divulgação

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